Mortes e imbecilidade, os recordes brasileiros

A incrível saga dos dirigentes de futebol que querem a volta do público nos estádios mesmo com recordes de mortes por Covid19.

Mortes e imbecilidade, os recordes brasileiros

Estádios vazios são tristes símbolos da pandemia no mundo. Antes o silêncio do vazio, que a celebração que leva à morte. Foto: Arina Krasnikova / Pexels / Uso livre autorizado

Paulo Augusto Neto

Na primeira sexta-feira de março de 2021, o Brasil registrou o número de 1800 mortes em virtude da pandemia de Covid19. Já há algum tempo, diariamente a média móvel de óbitos vem quebrando recordes, transformando o país não apenas no epicentro da doença no mundo, como ainda o colocando numa posição de ameaça global para a humanidade, dada a falta de medidas eficazes para combater o alastramento do vírus.

Nessa mesma sexta-feira, dirigentes da Ferj (Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro) e dos 12 clubes que disputam o Campeonato Carioca da primeira divisão realizaram uma reunião virtual para discutir um tema que julgavam importante para o prosseguimento da competição.

Dada a grave situação pandêmica, nada mais compreensível que o encontro acontecesse de maneira remota. O inacreditável foi o temada reunião: o retorno do público aos jogos do torneio no Rio de Janeiro.

Eis o fato: no momento em que mortos se multiplicam e especialistas alertam que o grave momento vivido no país está apenas começando, senhores, dirigentes de futebol debatem e defendem – claro, em reunião remota – o retorno do público aos estádios de futebol.

Segundo os defensores da ideia, inserida como possibilidade no regulamento da competição e, inicialmente, aprovado por todos os times, tudo seria feito de maneira “segura”. Apenas quem já contraiu o novo coronavírus poderia ter acesso ao estádio e teriam que ter IgG alto. Pessoas com comorbidades não estariam autorizadas a ir para o estádio. E o público permitido seria pequeno. No Maracanã, por exemplo, seriam permitidas “apenas” 19 mil pessoas.

Em paralelo a isso, vamos a alguns dados: o país vacinou apenas 3% de sua população e o governo segue pouco preocupado em adquirir imunizantes; hospitais de quase todo o país estão com superlotação nas UTIs e o perfil dos doentes graves tem mudado, atingindo cada vez mais pessoas jovens; estudos mostram que já ter sido contaminado pelo sars-cov-2 não impede uma nova contaminação, especialmente pela nova variante brasileira, a P1, que teve início no Amazonas; por fim, o país não vive um cenário de redução no número de mortes e infecção. Não vive sequer um platô. O Brasil vive um viés de alta. E a expectativa é de dias muito duros pela frente.

Diante destes dados e a absurda ideia da Ferj, três dos grandes clubes do Rio – Vasco, Botafogo e Fluminense -, se posicionaram publicamente contra o retorno do público. Um clube, convenientemente, optou pelo silêncio – o Flamengo.

As federações do Paraná e de Santa Catarina suspenderam suas competições locais até que as UTIs voltem a ter condições de atender a todos os que necessitarem. Outros Estados, mesmo descartando a paralisação do futebol, não discutem a possibilidade de ter público nos estádios. A Federação do Rio de Janeiro quer jogo. Quer público. E, no final das contas, está, com o perdão da expressão, cagando para eventuais vítimas que venham a surgir a partir das aglomerações incentivadas e autorizadas pela rubrica oficial.

O Brasil vive uma distopia. Nela, genocidas que foram alçados à esfera de poder acendem fogueiras. Seus seguidores, sorrindo e arrotando ignorância, fazem questão de se jogar nelas. O problema é que eles não se queimam sozinhos. O fogo não para de se alastrar. Enquanto isso, o Brasil vai quebrando recordes. De mortes e imbecilidade.

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