Decisões contraditórias e insegurança jurídica ameaçam o desenvolvimento do Brasil

Dentre as mazelas que inibem o desenvolvimento do Brasil, a insegurança jurídica é uma das mais recorrentes. Decisões contraditórias do Poder Judiciário impactam negativamente a economia e prejudica todos os empreendimentos nacionais.

Matheus Roma Pereira

Na vida interssubjetiva, certeza e segurança são requisitos inerentes e essenciais para a realização de qualquer contrato, sobretudo nas negociações de alto risco. Ninguém em sã consciência faria acordos com uma empresa falida ou pediria empréstimos em um banco insolvente.

Ora, exigi-se o mesmo no âmbito do Estado civil, aliás, com muito mais seriedade e zelo, principalmente se uma nação pretende destacar-se ante as demais dentro de um mercado internacional cada vez mais técnico e competitivo. Por essa razão, os ordenamentos jurídicos pátrios devem se fundar sob um sistema baseado no adimplemento das obrigações firmadas, bem como na criação e interpretação uniforme de legislação eficiente para garanti-las.

A partir dessa análise, dentre as mazelas que inibem o desenvolvimento progressista do Brasil, a insegurança jurídica é uma das mais recorrentes, além de ser a causa de tantas outras.

A insegurança jurídica é um problema cuja gênese remete a fatores como, exempli gratia, a criação de uma grande quantidade de leis e demais instrumentos normativos, muitos de redação confusa e contrária à Constituição Federal; sua constante alteração sem que haja processo adequado de transição ou sequer uma breve análise de seu impacto econômico; e a imprecisão quanto à definição de direitos e deveres na ordem civil. Tais situações comprometem o presente e põem em dúvida o futuro da nação ao repercutirem sobre os setores tributário, trabalhista, empresarial e de infraestrutura.

Nesse víés, o Poder Judiciário, ao qual caberia o sagrado dever constitucional de garantir a estabilidade e promover a pacificação social por meio da resolução de conflitos, desponta hoje no cenário nacional como um dos maiores causadores de insegurança jurídica.

Em tese, é dever dos tribunais superiores uniformizar o direito e conferir estabilidade aos precedentes. Contudo, a sobreposição de órgãos e a confusão de competências entre esses tribunais gera ambiente de tensão e conflito, culminando nos constantes questionamentos das leis elaboradas pelo Congresso Nacional, nos julgamentos díspares em casos de natureza similar, na morosidade de atuação da justiça, no excesso de burocracia e nas inúmeras mudanças de entendimento jurisprudencial, motivadas, muitas das vezes, por interesses escusos de governos e de particulares que buscam influir nas decisões de magistrados em benefício próprio.

O grande problema, o qual parece ser ignorado por muitos do Judiciário, é que a falta de uma base segura e unívola para guiar as relações jurídicas provoca reverberações adversas sobre a economia, desorientando as empresas quanto à forma de proceder e quais resultados favoráveis poderão obter em um ambiente mercadológico brasileiro já tão propenso a riscos e instabilidades. Ademais, essa situação de insegurança jurídica é péssima para atrair investimentos, sobretudo de capitais estrangeiros, visto que muitos se sentem inseguros em investir nos títulos do Tesouro Nacional de países com credibilidade flutuante no mercado financeiro.

Soma-se a isso o fato de o Brasil também sofrer com uma grande barreira fiscal marcada por ingerências nas políticas públicas (algumas inclusive do próprio judiciário) e imprecisão nas atribuições de instâncias fiscalizadoras. Essa situação submete as empresas a mais orientações conflituosas, o que contribui para a autossabotagem da atividade econômica com o consequente aumento do denominado “Custo Brasil” sobre produtos e serviços nacionais. Dessa feita, o aumento do número de falências e/ou de abandono de investimentos no ramo empresarial gera mais desemprego e maior concentração de renda nas mãos de uma pequena parcela da população.

Nesse panorama, surge a Lei 13.874/19 com o intuito de reduzir esses problemas através da desburocratização da esfera privada, buscando fomentar empregos e garantir mais segurança e certeza aos negócios jurídicos. O cenário da época, inclusive, era bastante favorável e otimista, principalmente com país apresentando uma boa expectativa de crescimento superior a 2% em seu PIB.

Contudo, o advento da pandemia de Covid19 serviu para escancarar de vez os nossos vícios institucionais, agravados por gestões de risco ineficientes que tomaram inúmeras medidas de emergência, inclusive, contrárias ao que se tinha feito em 2019. Novamente, reaparece o excesso de intervencionismo estatal nas relações de cunho privado, notadamente através do paternalismo jurídico, princípio demagogista reponsável pelos casos nos quais os magistrados arrogam para si o papel de reguladores das vicissitudes do mercado, tomando decisões que: controlam preços, congelam reduções de aluguéis e interferem na propriedade privada.

Tais decisões são catastróficas para a economia, pois fomentam, entre outros males, o aumento da inflação. Sobre o assunto, em declaração ao jornal Valor Econômico, o Presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústria de Base (ABDIB) Venilton Tadini asseverou o seguinte:

“Vivemos diariamente em um trem fantasma. A cada esquina é um susto, em que decisões absolutamente monocráticas são tomadas ao arrepio da boa norma e dos procedimentos jurídicos”.

Isto posto, é imperativo destacar que há outras formas de mitigar os impactos econômicos da pandemia sem recorrer às arbitrariedades e ao autoritarismo do Estado. Afinal de contas, situações de urgência não elidem a aplicação das técnicas e leis do mercado, muito pelo contrário, elas ensejam a adequação às regras do jogo e uma administração pragmática, capaz de aproveitar as poucas oportunidades que possam surgir, evitando, assim, prejuízos maiores. O requisito aqui demandado é enxergar para além da crise, seguindo um planejamento que contemple todas as linhas de ação possíveis a fim de antever as consequências benéficas a longo prazo.

Logo, no meio público, seria interessante, por exemplo, a adoção de uma política pública de incentivo que estimule o particular a agir em parceria com o interesse público. A oferta de subsídios vinculados a determinadas ações das pessoas é uma alternativa viável para conseguir a cooperação coletiva em prol do combate á pandemia sem que haja afronta à ordem econômica nacional ou aos princípios e garantais fundamentais previstos pela Constituição Federal de 1988.

Já no âmbito privado, os indivíduos podem, dentro de sua autonomia legal e sempre em respeito aos princípios da boa-fé e da lealdade contratual, recorrer à negociação, alegando a superveniência da pandemia como caso fortuito e/ou força maior nas relações contratuias, ou acordando com a outra parte contraente medidas como o prolongamento de prazos para o adimplemento de obrigações e o seu parcelamento. Podem, igualmente, recorrer a soluções extrajudiciais seja pela conciliação, seja pelo juizo arbitral, ambas técnicas mais céleres, menos onerosas e desgastantes quando comparadas aos litígios dos processos judiciais.

Diante do exposto – parece não restar dúvida – o preço que pagamos pela insegurança jurídica e pelas desavenças dos tribunais é muito alto, não apenas quanto ao prejuízo da imagem do país no exterior, mas principalmente quanto aos impactos internos sobre a roda da economia, afetando direta ou indiretamente a vida de milhares de brasileiros. A boa notícia é que esses problemas podem ser mitigados, sendo fundamental para tanto que o Poder Judiciário, com especial atenção às Cortes Superiores, se dedique  ao estudo e aplicação da análise econômica do direito, disciplina que tornará a atividade desses tribunais cada vez mais técnica, profissional e apta a corresponder aos anseios da população brasileira por justiça, igualdade e estabilidade sociais.

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