Enriquecimento sem causa

Toda aquisição patrimonial deve ocorrer de uma causa, pois ninguém pode enriquecer do nada, segundo a lei. Se alguém mandar dinheiro por engano, via PIX, quem recebeu deve devolver o valor. Premissa também vale para os contratos de aluguel.

Enriquecimento sem causa

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Felipe Silva

Toda aquisição patrimonial deve ocorrer de uma causa, pois ninguém pode enriquecer do nada. O artigo 884 do Código Civil prescreve que “o enriquecimento ilícito traduz a situação em que uma das partes de determinada relação jurídica experimenta injustificado benefício, em detrimento da outra, que se empobrece, inexistindo causa jurídica para tanto”.

Existe enriquecimento injusto sempre que houver uma vantagem de cunho econômico, sem justa causa, em detrimento de outrem, como bem explica o professor Rafael de Menezes em seu livro Curso de Direito Civil – Volume 1.

Hoje em dia, com o avanço da tecnologia, é comum as pessoas realizarem formas rápidas de pagamento. Uma delas é o Pix, um meio muito utilizado no Brasil como maneira de se livrar das dívidas. O interessante desse sistema é que a pessoa envia dinheiro para alguém sem a necessidade de portar aquilo em espécie.

Mas, veja bem, se alguém mandar dinheiro por engano via Pix a uma pessoa que não era o credor da relação jurídica, esta pessoa que recebeu o valor, este que era injustificado benefício, cometeu o chamado enriquecimento sem causa.

Tomaremos o exemplo acima para entender os elementos de enriquecimento sem causa.

O primeiro deles é que acontece o enriquecimento de alguém, como é o caso da pessoa que recebeu o Pix. O segundo é o empobrecimento daquela que enviou o valor por engano a quem se beneficiou por erro. O terceiro elemento é o nexo de causalidade entre o ganho e a perda. Para isso, cabe observar o destinatário do encaminhamento do valor, o ganho de dinheiro de uma pessoa aconteceu por meio da perda de alguém, o que resta comprovado pelo envio do valor. O último elemento é a inexistência de causa justificadora. Ora, não teve uma razão de relação jurídica existente entre quem encaminhou e quem recebeu.

O mesmo artigo 884, parágrafo único, do Código Civil prescreve que “se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido”.

Um exemplo claro para explicar esse acontecimento é de alguém que furtou o celular de uma pessoa. Quem praticou o ilícito é obrigado a restituir o objeto e ainda pode responder penalmente com base no artigo 155 do Código Penal. Se quem furtou o celular tiver vendido, este terá que restituir o valor do celular pelo que isto valia na época em que foi exigido de volta.

O enriquecimento sem causa também acontece quando o patrimônio de alguém tem um acréscimo em virtude de uma melhoria feita por outra pessoa e este que recebeu a benfeitoria não devolve o valor para o sujeito. Exemplo de um locatário alugar um imóvel e quando o mesmo deixa o imóvel, ele não é beneficiado pelo locador. Neste caso, o locador foi beneficiado por essas benfeitorias. A benfeitoria necessária o locador é obrigado a restituir o valor para o locatário e a benfeitoria útil, assim expressamente com concordância do locador, também é devida o seu valor. Então, configura-se enriquecimento sem causa quem não devolve em dinheiro aquilo que uma pessoa gastou em locação.

Não só quando não tenha acontecido causa que seja a razão do enriquecimento que a pessoa precisa restituir, mas também quando a relação jurídica tenha se rompido de alguma forma. O artigo 885 do Código Civil prescreve que “a restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir”. Exemplo para este caso é quando o pai paga pensão alimentícia a um filho, que já faleceu, mas quem recebeu foi a mãe. Logo, a mãe é obrigada a devolver o valor da pensão ao pai, porque não mais existe o filho a quem tinha o direito sobre a pensão.

O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa visa impedir o justificado aproveitamento do patrimônio alheio. Inspira-se em regras de equidade. Ninguém enriquece do nada. Portanto deve existir uma justa causa para que isso ocorra. O enriquecimento pode emanar de ato ou negócio jurídico válido, ou ato de terceiro.

As relações jurídicas econômicas são voltadas para alguém comprar um bem, pagando o seu devido valor a uma pessoa, esta entrega o bem a quem comprou, acontecendo no que enseja como ambas são credoras e devedoras. O artigo 421 do Código Civil prescreve que “a liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato”, ou seja, demanda de trocas úteis e justas. O Direito admite essa troca e por razão lógica não permite alguém enriquecer sem causa.

O enriquecimento sem causa também acontece quando alguém multa e esta é com valor altíssimo o que atingi a razoabilidade com a finalidade a que se destina. Assim estava o acolhimento do Supremo Tribunal Federal no ARE 1321303 A GR-ED, no qual deu provimento aos embargos de declaração tão somente para afastar a multa aplicada no julgamento do agravo interno. No caso, considerando o elevado valor da causa, a multa fixada no máximo legal mostra-se desproporcional a seu objetivo, sob pena de resultar exclusivamente em enriquecimento sem causa de uma das partes.

A ação in rem verso objetiva reequilibrar os patrimônios que foram desequilibrados sem fundamento jurídico. Difere, portanto, da ação de indenização por ato ilícito. Caráter subsidiário (última ratio), artigo 886 do Código Civil que prescreve “não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido”. Para isso, leva-se em conta os elementos do enriquecimento sem causa.

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